Ana Paula Andrade
Isabel Pinheiro
A origem da Cozinha Mineira
Dois
períodos históricos que marcaram a vida econômica, social, política e cultural
em Minas Gerais: o período da mineração, cujo apogeu se deu no século XVIII; e
o período da "ruralização", momento de concentração da vida econômica
e social nas fazendas, que sucedeu ao declínio das minas e durou do final do
século XVIII até o início do século XX.
A
formação dos primeiros núcleos urbanos de Minas Gerais ocorre com o Ciclo da
Mineração que nunca conheceu a fartura de alimentação. Muitos morreram de fome
com as mãos cheias de ouro. Há quem diga que a abundante cozinha mineira surgiu
da fome.
Com
o tempo totalmente dedicado à atividade mineradora, e sem terras adequadas ao
plantio, plantava-se e criava-se muito pouco e o produto escasso das roças era
caro. Sal, farinha, feijão, açúcar,
galinha, milho e aguardente eram caríssimos, assim como o fumo, as drogas
medicinais, armas, ferramentas, tecidos, calçados e muares. O alimento básico achava-se no milho e na
mandioca. Os escravos viviam em
condições subumanas e eram os que mais sofriam com a pobreza da alimentação e a
fome. Durante séculos, a Colônia se manteve fechada a estrangeiros. A região
das Minas, principalmente, era submetida a um rigoroso controle, o que
encarecia muito a chegada de mercadorias. Tudo era caríssimo.
Do
Nordeste, pelos caminhos do Rio São Francisco, os mineiros importavam gado
vacum e escravos africanos, e da Europa, manufaturados diversos. Das capitanias
do Rio de Janeiro e São Paulo, importavam o fumo, doces, frutas, legumes, carne
seca, dentre outros produtos.
Contribuições Étnicas
- Índios: habilidades na caça e coleta, no cultivo da mandioca, milho, abóbora e amendoim. Da mandioca, faziam a farinha, o beiju e as bebidas alcoólicas. Havia o escaldado, o pirão, a paçoca, as farofas, os pratos à base de mandioca e de milho, que se derivaram para as canjicas, mingaus e papas.
- Negros
africanos: incorporaram à sua dieta os animais a que tinham acesso, como
tatus, lagartos e capivaras. A cozinha africana privilegia os assados em
detrimento das frituras. Assim, o caldo é um item importante, já que
provém do alimento assado ou simplesmente preparado com água. Com os
negros vieram também a banana, o café, a pimenta malagueta e o inhame.
- Portugueses:
frutas e legumes, manga (Índia), quiabo (África) e couve (Portugal). Eles
trouxeram também galinhas, gansos, patos, gado, arroz, cana de açúcar,
trigo, cebolinha, alho e laranja. No tempero, além de impor o gosto pelo sal e ensinar
a salgar a carne para conservá-la, trouxeram consigo o cravo, a erva-doce,
a canela e o alecrim. Utilização do ovo da galinha, que propiciou um
farto rendimento culinário: fritadas, doces, bolos, ovos cozidos,
estrelados, quentes, moles, baba-de-moça, doce de ovos, fios de ovos e
gemada com vinho do Porto.
Composição das Refeições
Ao
almoço, o angu era obrigatório. Com fubá e couve preparava-se o
Maneco-sem-Jaleco, papas mais simples que as portuguesas. Com a sobra,
preparava-se a Roupa Velha, também feita de carne seca desfiada em mistura com
farinha de mandioca, e às vezes, batatinhas. A gordura de porco era a usual. A
cebola sem cabeça, cebola de cheiro, alho, urucu, coentro e as pimentas
malagueta e do reino eram os condimentos habituais.
A
carne seca, assim como a fresca, de boi ou porco, era preparada de variadas
maneiras: assada; ensopada com arroz, ou com mandioca, ou com couve, ou com
palmito, ou com inhame, ou com vagens; picadinha, da mesma forma; frita, com
ovos batidos, ou desfiada, em forma de Roupa Velha; cozida com legumes.
Como
bebida, um copinho de restilo ao início das refeições era servido, mas só para
os homens. Pouco se usava o vinho, a não ser na consoada ou nas festas. Em
bailaricos e demais reuniões familiares, servia-se de aluá e capilé.
Os
mineiros sempre apreciaram doces e quitandas. Da tradicional doçaria
luso-brasileira, o doce de leite, de cidra, limão e laranja, a brevidade, o pé
de moleque, a pamonha envolvida em folha de bananeira, a queijadinha, a mãe
benta, o quebra-quebra, a broinha de fubá mimoso ou de amendoim e o biscoito de
polvilho eram os preferidos. Os doces de leite enrolados em palhas de milho
são, dentre todos, os mais autênticos.
A
lógica da economia de tempos difíceis impôs os alimentos cozidos e o
aproveitamento de tudo, inclusive das sobras, gerando composições igualmente
saborosas. As farofas e as sopas aproveitavam as sobras de carnes, legumes,
feijões e verduras, que ainda compõem o cardápio do mineiro contemporâneo. O
mexido, uma mistura de tudo que sobrou, era comido na primeira refeição da
manhã, antes da saída para a lida ou no jantar. Esse prato perdura ainda hoje,
sobretudo em fazendas, no interior de Minas Gerais ou nas madrugadas da capital
mineira, em muitos restaurantes de cardápio mais popular e nos botecos.
O
lombo, a leitoa e a galinha assados eram pratos de festa, de domingo, de
visitas. Na intimidade do dia-a-dia, os cozidos predominavam: o feijão, o angu,
o mexido, verduras e legumes cozidos, ou os legumes com carne, frango com quiabo, por exemplo, mandioca e
canjiquinha com carne, podendo ser costela ou suã de porco, costela de vaca e
outros.
Queijo
Em
Minas, o queijo, que hoje é uma das mais fortes identidades culinárias do
Estado, foi importado de outras regiões do país, até o final do século XVIII.
No cardápio do início do século XIX, os queijos apareciam citados à sobremesa,
acompanhando doces ou como complemento de ceias noturnas. No café da manhã,
acompanhavam farinha, café, ou angu com leite.
A
expansão do consumo de queijo em Minas ocorreu como consequência da necessidade
de se aproveitar o leite nos locais da província onde se intensificava a
pecuária. Hoje, o queijo de Minas ou frescal é iguaria mineira disputada por
turistas de todo o país e artigo vendido nos aeroportos quase como um souvenir
da cultura gastronômica regional.
Referências
- Cozinha
Mineira: Minas de muitos sabores.
Abdala, Mônica Chaves in Revista do Arquivo Público Mineiro, Ano XLII - N
º 2 - Julho-Dezembro de 2006. disponível em: https://www.mg.gov.br/governomg/portal/c/governomg/conheca-minas/5655-cozinha-mineira/60836-cozinha-mineira/5146/5044
- Gastronomia
Mineira http://descubraminas.com.br/MinasGerais/Pagina.aspx?cod_pgi=2981
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