quarta-feira, 15 de abril de 2015

Minas Gerais - Parte 1


Ana Paula Andrade
Isabel Pinheiro

A origem da Cozinha Mineira

Dois períodos históricos que marcaram a vida econômica, social, política e cultural em Minas Gerais: o período da mineração, cujo apogeu se deu no século XVIII; e o período da "ruralização", momento de concentração da vida econômica e social nas fazendas, que sucedeu ao declínio das minas e durou do final do século XVIII até o início do século XX.

A formação dos primeiros núcleos urbanos de Minas Gerais ocorre com o Ciclo da Mineração que nunca conheceu a fartura de alimentação. Muitos morreram de fome com as mãos cheias de ouro. Há quem diga que a abundante cozinha mineira surgiu da fome.

Com o tempo totalmente dedicado à atividade mineradora, e sem terras adequadas ao plantio, plantava-se e criava-se muito pouco e o produto escasso das roças era caro.  Sal, farinha, feijão, açúcar, galinha, milho e aguardente eram caríssimos, assim como o fumo, as drogas medicinais, armas, ferramentas, tecidos, calçados e muares.  O alimento básico achava-se no milho e na mandioca.  Os escravos viviam em condições subumanas e eram os que mais sofriam com a pobreza da alimentação e a fome. Durante séculos, a Colônia se manteve fechada a estrangeiros. A região das Minas, principalmente, era submetida a um rigoroso controle, o que encarecia muito a chegada de mercadorias. Tudo era caríssimo.

Do Nordeste, pelos caminhos do Rio São Francisco, os mineiros importavam gado vacum e escravos africanos, e da Europa, manufaturados diversos. Das capitanias do Rio de Janeiro e São Paulo, importavam o fumo, doces, frutas, legumes, carne seca, dentre outros produtos.

Contribuições Étnicas

  • Índios: habilidades na caça e coleta, no cultivo da mandioca, milho, abóbora e amendoim. Da mandioca, faziam a farinha, o beiju e as bebidas alcoólicas. Havia o escaldado, o pirão, a paçoca, as farofas, os pratos à base de mandioca e de milho, que se derivaram para as canjicas, mingaus e papas.

  • Negros africanos: incorporaram à sua dieta os animais a que tinham acesso, como tatus, lagartos e capivaras. A cozinha africana privilegia os assados em detrimento das frituras. Assim, o caldo é um item importante, já que provém do alimento assado ou simplesmente preparado com água. Com os negros vieram também a banana, o café, a pimenta malagueta e o inhame.

  • Portugueses: frutas e legumes, manga (Índia), quiabo (África) e couve (Portugal). Eles trouxeram também galinhas, gansos, patos, gado, arroz, cana de açúcar, trigo, cebolinha, alho e laranja. No tempero,  além de impor o gosto pelo sal e ensinar a salgar a carne para conservá-la, trouxeram consigo o cravo, a erva-doce, a canela e o alecrim. Utilização do ovo da galinha, que propiciou um farto rendimento culinário: fritadas, doces, bolos, ovos cozidos, estrelados, quentes, moles, baba-de-moça, doce de ovos, fios de ovos e gemada com vinho do Porto. 
Composição das Refeições

Ao almoço, o angu era obrigatório. Com fubá e couve preparava-se o Maneco-sem-Jaleco, papas mais simples que as portuguesas. Com a sobra, preparava-se a Roupa Velha, também feita de carne seca desfiada em mistura com farinha de mandioca, e às vezes, batatinhas. A gordura de porco era a usual. A cebola sem cabeça, cebola de cheiro, alho, urucu, coentro e as pimentas malagueta e do reino eram os condimentos habituais.

A carne seca, assim como a fresca, de boi ou porco, era preparada de variadas maneiras: assada; ensopada com arroz, ou com mandioca, ou com couve, ou com palmito, ou com inhame, ou com vagens; picadinha, da mesma forma; frita, com ovos batidos, ou desfiada, em forma de Roupa Velha; cozida com legumes.

Como bebida, um copinho de restilo ao início das refeições era servido, mas só para os homens. Pouco se usava o vinho, a não ser na consoada ou nas festas. Em bailaricos e demais reuniões familiares, servia-se de aluá e capilé.

Os mineiros sempre apreciaram doces e quitandas. Da tradicional doçaria luso-brasileira, o doce de leite, de cidra, limão e laranja, a brevidade, o pé de moleque, a pamonha envolvida em folha de bananeira, a queijadinha, a mãe benta, o quebra-quebra, a broinha de fubá mimoso ou de amendoim e o biscoito de polvilho eram os preferidos. Os doces de leite enrolados em palhas de milho são, dentre todos, os mais autênticos.



A lógica da economia de tempos difíceis impôs os alimentos cozidos e o aproveitamento de tudo, inclusive das sobras, gerando composições igualmente saborosas. As farofas e as sopas aproveitavam as sobras de carnes, legumes, feijões e verduras, que ainda compõem o cardápio do mineiro contemporâneo. O mexido, uma mistura de tudo que sobrou, era comido na primeira refeição da manhã, antes da saída para a lida ou no jantar. Esse prato perdura ainda hoje, sobretudo em fazendas, no interior de Minas Gerais ou nas madrugadas da capital mineira, em muitos restaurantes de cardápio mais popular e nos botecos.

O lombo, a leitoa e a galinha assados eram pratos de festa, de domingo, de visitas. Na intimidade do dia-a-dia, os cozidos predominavam: o feijão, o angu, o mexido, verduras e legumes cozidos, ou os legumes com carne,  frango com quiabo, por exemplo, mandioca e canjiquinha com carne, podendo ser costela ou suã de porco, costela de vaca e outros.

Queijo

Em Minas, o queijo, que hoje é uma das mais fortes identidades culinárias do Estado, foi importado de outras regiões do país, até o final do século XVIII. No cardápio do início do século XIX, os queijos apareciam citados à sobremesa, acompanhando doces ou como complemento de ceias noturnas. No café da manhã, acompanhavam farinha, café, ou angu com leite. 

A expansão do consumo de queijo em Minas ocorreu como consequência da necessidade de se aproveitar o leite nos locais da província onde se intensificava a pecuária. Hoje, o queijo de Minas ou frescal é iguaria mineira disputada por turistas de todo o país e artigo vendido nos aeroportos quase como um souvenir da cultura gastronômica regional.





Referências

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